Uma odisséia cearense
O que é possível fazer com R$ 300? O cineasta cearense Daniel Abreu fez um filme. Intitulado Centopéia, o longa é o primeiro de ficção científica do Ceará e se passa no ano 2056. O lançamento está marcado para o próximo dia 26, no antigo Cine São Luiz
O ano é 2056. O Brasil desenvolveu seu programa espacial e acaba de enviar uma equipe ao planeta Marte. Comandada por uma astronauta, a nave sofre uma pane e perde por completo a comunicação. Enquanto isso, um objeto não-identificado está em rota de colisão com a Terra e o impacto irá provocar a morte de quase toda espécie de vida. Paralelamente, no interior do Ceará, um fazendeiro se depara com situações sobrenaturais. O enredo futurista é do longa-metragem Centopéia, dirigido pelo cineasta cearense Daniel Abreu. Primeira ficção científica produzida no Ceará, o filme custou a surpreendente bagatela de R$ 300. Como isso foi possível?
Gravado em formato digital, sem recursos de lei de incentivo ou edital, o filme contou com o trabalho voluntário de atores, técnicos e produtores. Ninguém recebeu cachê. O diretor conta que as cenas de estúdio foram gravadas entre 2005 e 2006 em espaço cedido pela Faculdade Grande Fortaleza (FGF). Já as externas foram feitas em 2007, na Fazenda Pinhão, em Quixeramobim, propriedade do avô do cineasta. Ninguém pagou aluguel nem hospedagem. A maquiagem, o figurino e os objetos de cena contaram com a capacidade de improviso da equipe.
Mesmo com toda essa economia, - mas sem as amarras de cronograma e orçamento pré-determinados de um patrocínio -, foram necessários quatro anos de produção para finalizar o trabalho de 82 minutos de duração. 'Nós tentamos fazer um filme sem grana, com o mínimo de dinheiro, mas uma coisa bem feita. Fica longe de ser um filme trash. Eu só usei todo esse tempo exatamente para não cair no ridículo', conta o diretor, em entrevista por telefone. 'Mas é claro que se a gente tivesse 300 mil reais ao invés de 300 seria bem diferente, mas a gente alcançou o que a gente queria', acredita a produtora Camile Queiroz, que também atuou como coadjuvante. 'De forma nenhuma está uma coisa risível', defende. Segundo a produtora, o dinheiro gasto foi destinado para combustível e alimentação, durante as gravações em Quixeramobim.
Segundo o diretor, o filme não tenta se aproximar dos títulos hollywoodianos do gênero. 'Eu não fui atrás de nenhum elemento de outro filme, como Solaris ou 2001: Uma Odisséia no Espaço. Eu não faço nenhum tipo de comparação'. O cineasta se defende das críticas que recebeu desde que lançou o primeiro teaser do filme em 2005. 'Disseram que era cinema americano no Ceará. Mas cadê a liberdade de expressão?', questiona. 'Eu não tenho medo de mudar de tema. Existe uma coisa aqui no Ceará que é muito forte. Você tem muitas produções sobre o cangaço, miséria e história do Ceará. Mas, fora isso, existem milhares de outros temas e nada disso é explorado', diz.
Com elenco formado pelos atores Camilo Vidal, Jeanne Feijão, Camile Queiroz e Bruno de Castro, o filme utilizou efeitos em animação 3-D para as cenas da astronave e efeitos especiais em explosões, fumaças e tempestades. As sequências que se passam no planeta Marte foram gravadas em chroma key. Mas a ficção científica, de acordo com o diretor, é apenas pano de fundo para uma história de drama. No longa, o meio-ambiente está seriamente modificado por questões climáticas e todos parecem isolados e solitários. A história acompanha a trajetória do fazendeiro Joel em sua tentativa de sobrevivência e seu processo de humanização. Partindo disso, o filme aborda temas como a solidão humana, a falta de comunicação e o processo cíclico e repetitivo da existência. 'As pessoas precisam evoluir enquanto seres humanos, essa é a maior mensagem do filme', diz Abreu. Depois do lançamento, os produtores do filme pretendem incluir o longa no circuito de festivais pelo Brasil e fora do país pelos próximos dois anos.
Centopéia - Lançamento do filme, dia 26 de julho, a partir das 20 horas, no Centro Cultural Sesc Luiz Severiano Ribeiro, o Cine São Luiz (Pça do Ferreira, s/n - Centro). Informações: contato@videcine.com.br.
QUEM É DANIEL ABREU
Daniel Abreu é um cineasta de 25 anos com mais de 10 filmes no currículo, vários deles já exibidos no festival Cine Ceará, como Mormaço (2003), Underground Prison (EUA, 2000 - indicado ao Prêmio The Director´s View 2001) e O Desertor (2000). O cineasta é hoje mais conhecido pelos quadros cômicos que cria em seu programa Vide Cine, exibido pela FGF TV, emissora onde trabalha como diretor de criação e pelo nossa rádio peripatético. Abreu também atua na produção de clipes, vídeos publicitários e vídeos institucionais.
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