Professora da UFC analisa polêmica em torno do arcerbispo de Olinda-Recife
A polêmica em torno do arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso, prossegue. Ele excomungou, mas o Vaticano diz que não, equipe médica que fez aborto em criança de 9 anos, que, vítima de estupro, acabara grávida de gêmeoos. A professora Helena Lutescia L. Coelho, da UFC, manda artigo para o Blog com o título "A menina e o arcebispo".
A cada nova frase do arcebispo eu me indagava quem seria mais digno de horror, ele ou o estuprador?... e prosseguia na minha análise: o homem-monstro deve ter sido violentado mil vezes em sua vida miserável, brutalizado por uma sociedade injusta e desigual, sem a oportunidade humanizadora do afeto ou da educação.... já o arcebispo, risonho e bem nutrido, educado nas leis da igreja católica, acostumado à bajulação do beija-mão, dedicou a sua vida à permanência dessa mesma sociedade injusta e escravocrata ...ambos, de forma cruel, negaram a uma menina de 9 anos o direito à sua humanidade . Não me surpreendia que o arcebispo não manifestasse a sua condenação ao estuprador, de vez que, com seus atos e manifestações, ambos se colocavam no mesmo patamar ético, ou seja, na mais absoluta, ausência de ética.
Pensei: ainda bem que o Brasil definiu em sua constituição que somos um estado laico, senão a equipe médica que prestou atendimento à menina estaria presa, além de excomungada.
Imagino que grande parte da sociedade brasileira deu-se conta do risco que corremos de que igrejas ou religiões possam determinar as nossas escolhas como sociedade ou como indivíduos livres. Basta rever a história ou olhar em volta no mundo atual, para ver a que isso leva. Quase todas as religiões são excludentes, coercitivas, impõem suas verdades como sendo regras absolutas que todos deveriam seguir. Costumam se associar ao poder político para melhor exercer o controle da sociedade e das pessoas e, de acordo com esse poder, impõem seus símbolos nas instituições e espaços públicos. Também, com a conivência ou permissividade do poder político, manipulam a informação e a comunicação, se imiscuem na educação dos jovens e na pesquisa científica, impondo idéias obscurantistas que buscam impedir a contestação de seus dogmas.
Individualmente cada um de nós tem suas idéias e crenças e pauta a sua vida conforme lhe aprouver dentro dos limites que as leis e os costumes impõem. O Brasil procurou garantir essa liberdade aos seus cidadãos através de nossa carta magna e deixou explicitado o caráter laico do estado brasileiro. É preciso que não haja ambigüidade no significado desse laicismo no que diz respeito às políticas públicas, normas internas das instituições e no comportamento dos gestores de órgãos públicos. Manifestações de autoridades religiosas sobre fatos sociais devem ser encaradas apenas como parte do contexto democrático e não como algo que determine o que devemos fazer; Quando elas ferem o nosso senso de humanidade devem servir apenas para reforçar o horror ao obscurantismo e o nosso compromisso de defender a liberdade que conquistamos.
Helena Lutéscia L. Coêlho
Professora Titular da UFC
Via: Eliomar de Lima
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